quarta-feira, 5 de maio de 2010

MOÇAMBIQUE

GENERALIDADES

Moçambique, até 1975, viveu sob a tutela do colonialismo português.
O colonialismo, sempre cruel e violento, procurava apenas extrair as eventuais riquezas existentes e garantir posições geográficas estratégicas. Ao povo, nenhum direito. Só em 1961, por exemplo, foi permitida a concessão da nacionalidade portuguesa aos negros.
Mas, havia moçambicanos brancos, filhos dos colonos estrangeiros, educados na Europa. Havia, também, moçambicanos negros, alguns no exílio, que conseguiam estudar e entender a opressão aos quais estavam expostos.
A independência, conseguida em violenta e cruel guerra de libertação, só foi reconhecida oficialmente no Acordo de Lusaka em 07 de setembro de 1974 --- por extrema coincidência, mesmo dia e mês que, segundo os historiadores, Pedro de Orleans, depois D. Pedro I, teria dado o “Grito do Ipiranga” que libertou o Brasil de Portugal, isto em 1822.

PARECE INDICAR QUE O DIA 7 DE SETEMBRO FOI FATÍDICO PARA OS COLONIALISTAS PORTUGUESES.

Vale ressaltar que, apesar da data de 7 de setembro de 1974 (acordo de Lusaka) ser reconhecida como data da libertação do colonialismo, com o reconhecimento oficial da independência pelos portugueses, só quase 1 ano depois, em 25 de junho de 1975 foi proclamada a independência de Moçambique, com o hastear da bandeira nacional e o célebre discurso de Samora Machel no Estádio de Machava e sua investidura oficial no cargo de Presidente da República Popular de Moçambique.

Talvez por este modelo de poder colonial perverso, tanto sob o ponto de vista da crueldade nas relações com os colonizados quanto na total ausência de qualquer planejamento estratégico, os portugueses, também aqui, são vistos como pessoas brutas, extremamente cruéis e pouco inteligentes. Aqui, as piadas de português são muito mais comuns que no Brasil. Pessoas com nível elevado de educação, como jornalistas e professores, falam abertamente que Portugal é “o País mais pobre da Europa”, e que os portugueses são “burros”, “grosseiros”, “porcos” --- existem outros adjetivos que não cabem neste documento, pelo viés extremamente deselegante como os portugueses são tratados em Moçambique..

A VERDADE É QUE É DIFÍCIL ENCONTRAR ALGUÉM, EM QUALQUER PARTE DO MUNDO, QUE FALE DOS PORTUGUESES COM ELOGIOS OU PALAVRAS AMÁVEIS.

Claro que existe toda uma mágoa pelos anos de repressão explícita do governo português. Mas, é claro também, pelo menos para mim, que os portugueses existiram como potência colonialista apenas pela sua localização estratégica, na saída da Europa para o Atlântico. Ao contrário de outras potências coloniais que, apesar das arbitrariedades do colonialismo por si mesmo, conseguiam deixar um legado de visão progressista e planejamento estratégico. Os portugueses não. Além da reconhecida falta de competência na gestão das províncias e dos grosseiros costumes legados (falta de educação no trato com as pessoas, falta de higiene pessoal, dentre muitos outros) não deve ser gratuita a fama de pouco inteligentes ou, para sermos mais elegantes, a fama de “lentos no ato de pensar” que se apregoa aos portugueses por onde eles passam.


SAMORA MOISÉS MACHEL

Samora Machel era um homem singular. De simples funcionário público a Comandante da FRELIMO --- Frente de Libertação de Moçambique foram poucos anos. Mal sabia o Governo Colonial Português que, em marco de 1963, ao decretar a prisão daquele “enfermeiro” (auxiliar de enfermagem no Hospital Geral da Capital Lourenço Marques, hoje Maputo) que conspirava contra o poder constituído, ensejaria sua fuga para Dar-es-Salaam, na vizinha Tanzânia e daí, para a guerra de libertação.
A FRELIMO foi criada em 1962 por Eduardo Mondiane e um grupo de moçambicanos que viviam no exílio, expulsos pelo Governo Português.
Samora só foi incorporar-se ao grupo em 1963 e assumiu o comando em 1969, após a morte de Mondiane.
Samora, profundamente influenciado pelo modelo marxista-leninista, tomou treinamento militar na Argélia e em Cuba e participou do inicio da luta armada em setembro de 1964.

A GUERRA FOI SANGRENTA DE LADO A LADO.
MAS, TODAS AS GUERRAS SÃO ESTÚPIDAS, SANGRENTAS E DESNECESSÁRIAS.
NÃO NOS OCUPAREMOS DELA.

Em 7 de setembro de 1974, na cidade de Lusaka, capital da vizinha Zâmbia e importante entroncamento ferroviário, a FRELIMO do Comandante Machel assinou um acordo de cessar fogo e reconhecimento da independência de Moçambique pelo Governo Português.
Mas, havia toda uma “máquina” estatal colonial a ser desmontada, resistências a serem vencidas e, principalmente, a informação necessitava ser transmitida aos cidadãos de uma nação sem unidade lingüística, sem unidade étnica e sem instrumentos de comunicação.
Samora Machel só tomou posse como Presidente de Moçambique em 25 de junho de 1975, após a proclamação da independência e promulgação da constituição do novo país.


A FRELIMO NO PODER
A GUERRA CIVIL

A FRELIMO desde os tempos da guerra, recebia ajuda do bloco soviético. Dizendo-se um “Governo Popular”, aproximou-se mais ainda dos governos totalitários de esquerda, após a vitória. Daí, como ocorreu em todo o mundo, a esquerda iniciou um processo ditatorial de imposição de suas “verdades” e criminosa estatização dos meios de produção. Resultado, o país cada vez mais pobre, afundava-se na corrupção dos agentes do novo governo e em revoltas populares dos descontentes com o novo regime. Também, como historicamente se registrou em todo o mundo, o governo de esquerda “popular” oferecia privilégios aos próximos do poder e fome e total falta de assistência aos que não aceitavam suas teorias.
Foi alterado o nome da Capital de Lourenço Marques (segundo os historiadores, Lourenço e Marques foram os primeiros portugueses a se estabelecerem na região) para Maputo.
Diversas ruas foram rebatizadas, trocando-se os nomes portugueses originais para nomes de heróis das potencias esquerdistas da época e/ou para referências históricas a ela ligadas.
Assim, em Maputo existem as avenidas Vladimir Lênin, Karl Marx, Máo Tse Tung, Ho Chi Min, Guerra de Libertação, Acordos de Lusaka, dentre outras.

Samora era um líder pragmático. Os desmandos da FRELIMO eram rapidamente explicados pela retórica de esquerda pela qual o bem coletivo supera as necessidades individuais.

CONTA A LENDA QUE SAMORA SOUBE, ATRAVÉS DOS SERVIÇOS RESERVADOS DE INFORMAÇÕES DA FRELIMO,QUE A ESPOSA DE UM COMANDANTE QUE PRESTAVA SERVIÇOS NO NORTE DO PAÍS,
ESTAVA DE ROMANCE COM UM ENFERMEIRO.
FOI ATÉ A CASA DO COMANDANTE E, EM CONVERSA COM A ESPOSA, DESCOBRIU,
ALÉM DO ROMANCE, UMA GRAVIDEZ DE UM MÊS.
SEM HESITAR, APÓS FORTE DESCOMPOSTURA NA MULHER,TRANSFERIU O ENFERMEIRO PARA A PROVÍNCIA DE NIASSA E DEU UM MÊS DE FÉRIAS “POR BONS SERVIÇOS PRESTADOS” AO COMANDANTE:
CLARO QUE, APÓS ATUALIZAÇÃO DE SUA VIDA SEXUAL, O COMANDANTE FICOU EXTREMAMENTE FELIZ AO SABER DA GRAVIDEZ E, DEPOIS, DO PARTO PREMATURO DE SUA ESPOSA.
DE UMA SÓ CAJADADA, SAMORA TERIA PRESERVADO O MORAL DOS OUTROS COMANDANTES,
QUE NÃO ASSOCIARIAM ESTE FATO ÀS SUAS ESPOSAS,EVITARA COMENTÁRIOS MALDOSOS E,
EM ÚLTIMA ANÁLISE,IMPEDIRA UMA POSSÍVEL ONDA DE ASSASSINATO EM MASSA DAS ESPOSAS DOS MILITARES

O ambiente era extremamente favorável ao surgimento de movimentos internos e à guerra civil.

NESTE AMBIENTE CONTURBADO DOS DESMANDOS DA ESQUERDA,SURGE A RENAMO --- RESISTÊNCIA NACIONAL MOÇAMBICANA E INICIA-SE UMA CRUEL GUERRA CIVIL QUE DURARIA ATÉ 1992.

Segundo nos disse pessoalmente um dos mais reconhecidos historiadores d e Moçambique, o desgaste da FRELIMO com as esquerdas aconteceu com a total “falência” do País em 1977 e não, como se apregoa, com a derrubada do muro de Berlim e com a “implosão” do bloco soviético, que só ocorreria tempos depois.
Antes disto, segundo a mesma fonte, o Presidente Samora já estava desiludido com o prometido apoio financeiro da URSS e já entrava em entendimentos com o FMI e com o Banco Mundial a partir de 1983.
Mas, apesar desta falta de ajuda, o governo da FRELIMO continuava com as idéias totalitárias de esquerda, pelas quais não se admite opositores, não há liberdade de expressão e muito menos qualquer garantia individual.
A corrupção era endêmica.
Os agentes públicos, todos da FRELIMO, corrompiam e corrompiam-se abertamente.
Enquanto isso, no interior do País, principalmente nas matas das regiões norte e oeste, a guerra civil continuava matando milhares de moçambicanos.
Graça Machel, esposa do Presidente e Ministra da Educação determinou o fechamento da Faculdade de Direito porque, segundo registros da época, a “faculdade de direito só formava ladrões para enganar o povo”.
Na mesma época, eram fornecidas generosas bolsas-de-estudo para que filiados ao partido fossem estudar Direito na União Soviética, em Paris ou em Londres.
Os historiadores registram fatos muito curiosos sobre a primeira-dama, que oscilam entre autoritarismo e crueldade e vão para uma imagem de “mãe dos pobres” e outros adjetivos tão a gosto dos tiranos do terceiro mundo.

SOBRE A SENHORA GRAÇA MACHEL, TERCEIRA ESPOSA DO PRESIDENTE SAMORA, HÁ ALGO CURIOSO A REGISTRAR:
TRATA-SE PROVAVELMENTE DA ÚNICA MULHER DO MUNDO A CONSEGUIR A PROEZA DE SER PRIMEIRA-DAMA DE DUAS NAÇÕES DIFERENTES,POIS, APÓS A MORTE DE SAMORA MACHEL, CASOU-SE COM NELSON MANDELA, PRESIDENTE DA ÁFRICA DO SUL.
ATUALMENTE, CHAMA-SE GRAÇA MANDELA E VIVE NO PAÍS VIZINHO.
UM SALTO ENORME NA PIRÂMIDE SOCIAL:
DE PRIMEIRA DAMA DE UM DOS PAÍSES MAIS POBRES DO MUNDO PARA PRIMEIRA DAMA DE UMA DAS MAIORES ECONOMIAS DA ÁFRICA.
ELA ESTÁ NO GUINNESS...

Em 1986, em um acidente aéreo até hoje sem explicações morre Samora Machel aos 53 anos.

ESTE ACIDENTE É ASSUNTO PROIBIDO EM MOÇAMBIQUE.
POUCAS PESSOAS ACEITAM COMENTAR EM PUBLICO E,
OS QUE FAZEM RESERVADAMENTE;
NÃO HESITAM EM AFIRMAR QUE FOI UM ATENTADO.
MAS, NÃO HÁ PROVAS.
PELO MENOS DE CONHECIMENTO PUBLICO.

Claro que a FRELIMO culpou imediatamente a oposição pelo acidente.
Daí em diante, a guerra civil aumentou seu potencial de crueldade e atrocidades cometidas tanto pela RENAMO como pela FRELIMO.
O Sr. Cardoso Ngive, falando para nós, Assessores Internacionais, sobre organização do estado moçambicano, disse que um dos pré-requisitos para um jovem entrar na RENAMO, na época, era assassinar seus pais --- seria uma prova de amor à causa.
Mesmo descontando-se o fato do Sr. Ngive ser membro da FRELIMO, há registros históricos de atrocidades semelhantes, de ambos os lados.
Na região norte, principalmente nas províncias de Nampula e Cabo Delgado, a RENAMO destruiu vilas inteiras.
Ouvimos dezenas de habitantes das localidades de Memba, Nacarôa, Namapa, Chiúre, Ocúa, dentre outras onde existem rastros históricos da guerra --- todos os ouvidos, sem exceção, culpam a RENAMO pela destruição e por milhares de mortes.
Segundo estas pessoas, os homens da RENAMO, chamados pela população de “bandidos armados”, ficavam escondidos nas margens das estradas e, qualquer pessoa que tentasse passar era imediatamente assassinada à golpes de facão.

Não havia solução militar possível. O confronto militar, era consenso, só acabaria com uma solução civil e política.
Neste ambiente, a Constituição da República foi totalmente reformulada e surgiu a Constituição de 1990, que, ao contrário da anterior de inspiração totalitária de esquerda, garantia alguns avanços nos direitos civis do povo moçambicano, com liberdade de associação, liberdade de imprensa, dentre outros direitos tão renegados pelas esquerdas.
Logo depois, em 1992, foi celebrado o “acordo de Roma”, também denominado “acordo geral de paz” com o cessar-fogo entre a FRELIMO e a RENAMO.


A DEMOCRACIA

Com o cessar-fogo surgiram diversos partidos políticos, a partir das dissidências internas da FRELIMO e na RENAMO.
Mas, as eleições gerais de 1994 confirmaram o bi-partidarismo. Apenas FRELIMO e RENAMO conseguiram coeficientes eleitorais para indicar representantes para o parlamento.
A FRELIMO venceu as eleições confortavelmente, mas a RENAMO acusa fraudes em todas as secções eleitorais, desde a região pouco povoada das florestas da Província de Niassa até as cidades desenvolvidas de Maputo e Beira, dentre outras.
Sobre este fato, vale um registro: o sistema eleitoral em Moçambique prevê eleições partidárias proporcionais. E, além disso, vota-se no partido e não nos candidatos. Assim, o partido indica os deputados após as apurações. Não há campanha de candidatos, como se conhece no Brasil. As campanhas são do partido. O eleitor vota no partido e não no candidato. Apesar das vantagens da fidelidade partidária, que não existe no Brasil, aqui o deputado não tem nenhum compromisso com suas bases --- o compromisso dos deputados é com os dirigentes do partido, que o indicaram deputado e podem tirar-lhe o mandato a qualquer momento.
Muitos deputados eleitos sequer conhecem o local que representam. Este fato, somado ao voto não obrigatório, cria um índice de abstenção assustador.
O bi-partidarismo é, então, consolidado. Apesar de várias dissidências na FRELIMO e na RENAMO, agrupadas em partidos pequenos, nada ameaça o poder constituído.
Estas eleições demonstram um quadro que irá se consolidar nos anos seguintes: a predominância dos votos da FRELIMO nas regiões Sul, onde está a sede de governo e o parque fabril e intelectual e Norte, onde historicamente, iniciou-se a luta pela liberdade, comandada pela Frente. A RENAMO, por outro lado, concentra seu “poder de fogo” nas regiões centrais, notadamente em Beira.
Essa polarização das duas forcas políticas mais importantes do país vigora até os dias atuais, apesar do aumento da abstenção. Este fenômeno permite a leitura de um ambiente conservador, com acusações de lado a lado.

** Geraldo Bacelar Antón viveu e trabalhou em Moçambique, como Assessor Internacional, de 2005 a 2007.

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